sábado, 15 de outubro de 2011

Quanto vale?


(Escrito um dia antes de uma nova estrela surgir no céu.)

Numa época em que grande parte da humanidade parece ter aderido ao capitalismo, observo que quase todos os elementos das nossas vidas, seja no cotidiano mais árido, ou nas questões mais existênciais do ser humano, são medidos por um padrão de qualidade cada vez mais concreto, material, fútil e volátil.

Ter, viajar e mostrar se tornaram verbos chave em quase todas as conversas que tenho ouvido – ou lido, já que estamos em plena era digital – entre minhas amigas.

Mas pouco vejo de verdadeiro entusiasmo ou conhecimento adquirido nas experiências relatadas, que poderiam ter sido muito mais aproveitadas, se vividas de forma mais profunda ou simplesmente simples.

Essas minhoquinhas e mais alguns acontecimentos recentes me fizeram hoje, questionar-me aqui com meus pensamentos, a seguinte reflexão:

Quanto vale uma vida? Como saber se o que eu levo é uma boa vida ou, talvez, mediana, difícil...? Como equacionar isso?

Usando-me como cobaia para essa divagação, vamos ver se consigo construir e resolver essa continha...

Lembro que na minha adolescência eu queria sempre ter; ter aquela bolsa incrível, aquele esmalte maravilhoso, aquela calça... Ah... Aquela calça super difícil de encontrar! E mentiria se dissesse que meu humor não mudava após a aquisição daqueles mimos. Mas a euforia só durava até colocar os olhos, ou escutar, a publicidade do próximo grande objeto de desejo do momento...

Aí tomamos gosto pelas viagens! Viajar quase sempre é uma delícia, pelo menos para mim. Sair da rotina, mudar os hábitos, conhecer lugares e pessoas diferentes... Mas viagens podem ser muito mais do que fotos tiradas e visitas a lugares novos. Viajar também significa aceitar os costumes e conceitos de um local novo, diferente do seu de origem; significa viver como um cidadão diferente do que você costumava ser no seu lugar de origem.  Viajar é passar por estradas, rodovias, sobrevoar cidades, estados e países, com histórias únicas. É voltar ou se sentir além do tempo usual. É olhar nos olhos das pessoas deste novo lugar e sentir que mesmo com idiomas, política, estrutura social e cultural diversa, a essência humana é quase sempre a mesma.

E aí eu me pergunto... Com isso em mente e, por exemplo, com pouca grana no banco ou dificuldades de locomoção, não seria possível aproveitar de forma similar uma boa leitura de um livro sobre a Índia ou Afeganistão? Ou assistir a um bom documentário sobre a cultura brasileira nordestina, sobre as tribos indígenas amazônicas ainda isoladas da civilização moderna? Viajar, desta forma, ganharia uma visão muito mais ampla e relativa.

E quanto à época das celebridades, mostrar as minhas conquistas, eu sempre faria para as pessoas que eu amo, e que sei da sincera admiração e carinho para com meus ganhos, e que sem dúvida também estariam a postos para me auxiliar nas minhas dores e perdas.

Vamos equacionar?

(...)

Pois é... Essa vida me custa tão pouco... Eu só preciso cuidar da saúde do meu corpo - e nesse ponto dou um grande viva à medicina atual - amar, aceitar, aproveitar, fazer e observar, e reclamar menos...

Conheci há pouco tempo uma garotinha linda, cheia de vida e limitações para vivê-la. E ela sempre, em quase todas as nossas conversas, era só sorrisos e gentilezas. Atualmente está travando, talvez, a mais dura e decisiva luta de sua vida, e lembrando-me dela nestes dias com mais força, me questiono esses valores que damos a tudo nas nossas vidas. Posses, aparências, soberba, orgulho...

No fim, paradoxalmente, a medida destes valores de vida acaba encontrando sentido na iminência da morte. Independente da sua forma de interpretação, querido(a) leitor(a), minha consciência profunda da morte é que me serve, hoje, de parâmetro para viver. Para medir a humildade com que lido com o outro e comigo mesma, com os meus medos, as minhas raivas, frustrações, dores, vaidades, ninharias... É nessa passagem para algo desconhecido que vejo a igualdade dos seres. E por isso mesmo, procuro me prender às coisas que ainda posso modificar ou melhorar, aqui, em vida. Não para validar uma eternidade feliz, mas, acima de tudo, para fazer valer – e agradecer - a vida que tenho.  

Espero ter a liberdade de me livrar de tudo que me pese e que me impeça de lembrar que o que eu vivi e a forma como vivi, foi a mais bonita e dedicada. Com todas as limitações que nos são impostas, seja pela falta de dinheiro numa sociedade capitalista, ou uma doença grave, ou por qualquer outro motivo, se o preço da minha vida valeu, muito mais pelos sorrisos dados e ganhos, ela me valeu bem, e me custou bem mais em conta do que tudo que apostei nela.

Por: Paloma Portela