Falha o
senso comum para uma total compreensão sobre sua passagem e ordenação na
ocorrência dos eventos, que quase nunca se baseiam de acordo com um único
padrão.
Não me
refiro aqui, obviamente, ao cálculo dos nossos relógios, que medem eventos
repetitivos e regulares.
A “magia”
da qual suspeito a existência está envolvida em meio aos nossos atos, sensações
e emoções entrelaçadas ao tempo e às ocorrências da vida, em todos os nossos
dias.
Aliás, os
dias, horas, minutos, segundos, semanas, meses, anos, decênios, são unidades de
tempo criadas pelo homem a fim de nos servirem como garantias de que tudo de
concreto e funcional estará sempre em uma ordem, numa
sequência que planejamos para realizarmos, observarmos e compreendermos o
mundo, através da nossa existência num espaço que exige ação e reação.
No entanto
tenho notado algo estranho em relação ao tempo, parecendo-me que hoje em dia
até as nossas ideias e pensamentos aceleram a forma de vida que levamos.
E
consequentemente acelera-se o tempo que poderíamos e “teríamos” por direito,
para sonhar, imaginar, criar e refletir sobre as coisas mais simples e
importantes.
Mas
faltando-me a sabedoria que somente o tempo tem o privilégio de doar, meu
estranhamento baseia-se muita mais em indagações do que certezas...
Atualmente
minha relação com o tempo tem se estruturado, por exemplo, na tentativa de
compreender o envelhecimento, numa sociedade que prega a juventude eterna; no
uso que faço do tempo, precisando (e me
cobrando) cumprir satisfatoriamente todas as inúmeras funções que ao longo das
minhas necessidades (realmente necessárias ou não) me incumbi de realizar; no
meu amadurecimento como mulher dentro de relacionamentos amorosos, familiares,
amigáveis, sociais; no meu posicionamento dentro de um sistema planetário e
social, à medida que vou tomando consciência, e logo, tornando-me responsável
por agir ou não em conformidade com minha intuição, valores e princípios, e
tantos outros aspectos na vida de alguém. Aspectos que parecem ser apontados
somente quando notamos que estamos, em verdade,
dentro de um vagão aberto de um trem, em movimento, e que não só as paisagens
se modificam, mas o ar, a chuva, o vento, o frio e o sol dessas paisagens
acabam por também nos causar mudanças externas e internas.
Viver um
dia após o outro não
poderia ser uma expressão tida como metafórica ou meramente popular. Apesar da sabedoria
dada à fala do povo, seria como limitar tamanha verdade. Se estamos vivos,
estamos em movimento, e o mínimo que pode ser feito da nossa parte, é viver, e
viver de acordo com esse movimento. A essência é o movimento, e é sua
manifestação em contato com as particularidades da vida e das pessoas que é
oscilante.
Quem aqui
já ficou bem doente? Ou pôde presenciar ou ouvir uma história sobre pessoas com
doenças bem graves, que viveram por muito tempo em estado vegetativo, mórbido
ou mesmo apenas não podendo mexer-se tanto?
Há vida
ali, naquele corpo? Porque não haveria? O movimento pode ser de natureza
interna. Quem pensa, ama, sofre, culpa-se, alegra-se, está vivo, mesmo sem
executar movimentos externos. O tempo continua agindo sobre tudo, e as consequências
do movimento e de seus ciclos são as mesmas. Não há nada que escape à
incidência desse movimento invisível, mais compreensível para nosso
entendimento na definição de “tempo”.
Mas se a
rotina para alguns é atribulada, cheia de movimento, não se engane ao culpar
somente o movimento externo! Você pode estar dentro de um trem acelerado por
sua própria vontade, sofrendo muito mais e com maior frequência pelas
intempéries da natureza. E nem vai dar-se conta das mudanças — àquelas
prejudiciais ou as benéficas.
O tempo,
para o homem (e mulheres-maravilha!), é um onda silenciosa que transcorre
naturalmente, acima, entre e por meio de nós. Nossos
corpos navegam nesse movimento e respondem a ele, com a diferença de que são de
essência física, palpável, material. As únicas
certezas que sinto neste mundo são sobre a mortalidade do que é material e a de
que o tempo está em outra dimensão que não a do corpo físico.
Mas o
tempo influi nesse movimento e caracteriza nossos corpos e individualidades de acordo com a forma com que
deixamos nos levar ou pelo direcionamento que damos através de nossas atitudes.
Estas partem dos pensamentos e das ideias, que podem ou não tornarem-se
concretas. Para se tornarem concretas, exigirão movimento
da nossa parte. Se não ultrapassarem a fronteira do mental ou imaginário, ainda
assim, terão custado algum esforço ou tempo da nossa vida, para terem sido
criadas ou desenvolvidas.
Percebe
como o tempo molda seu dia?
Agora
pense: quanto nós desperdiçamos do tempo - que é a fonte
de todo o movimento na vida - em coisas supérfluas, complexas demais,
ilusórias, mesquinhas e desmerecedoras de tanto empenho?
O tempo é
precioso demais. E sua relação mágica de envolvimento conosco nos coloca numa
posição de responsabilidade para com seu uso.
Fazer bom
uso do tempo ultimamente, para mim, tem se resumido a
dar um tempo a ele.
Não
significa abrir mão de tudo, porque sua natureza é inexorável e não há como
mudar isso – “o tempo cura...”, “o tempo resolve...”, dizem
alguns. Não consigo enxergar cura ou resolução em apatia, submissão e ausência
de atitude e reflexão.
Dar tempo
ao tempo significa aceitar que seu transcorrer é natural, e que cada um de nós
trás um ritmo e velocidade peculiar. As diversas medidas de tempo criadas pelo
raciocínio humano servem para nos localizarmos de acordo com o mundo ao redor e
com nossos semelhantes, mas são insignificantes no que diz respeito a real
compreensão de si próprio e do fluxo maior de tempo que nos
envolve.
Nosso
reloginho interno é conectado infinitamente a alguma fonte mágica, que nos
(des)acelera, pausa, pressiona ou não, ajudando-nos a
regular nossas engrenagens para aproveitar plenamente a viagem
bacana de trem.
Por: Paloma Portela
Por: Paloma Portela