quinta-feira, 12 de julho de 2012

Tempo ao tempo

Acho que existe algo de mágico em nossa relação com o tempo...

Falha o senso comum para uma total compreensão sobre sua passagem e ordenação na ocorrência dos eventos, que quase nunca se baseiam de acordo com um único padrão.

Não me refiro aqui, obviamente, ao cálculo dos nossos relógios, que medem eventos repetitivos e regulares.

A “magia” da qual suspeito a existência está envolvida em meio aos nossos atos, sensações e emoções entrelaçadas ao tempo e às ocorrências da vida, em todos os nossos dias.

Aliás, os dias, horas, minutos, segundos, semanas, meses, anos, decênios, são unidades de tempo criadas pelo homem a fim de nos servirem como garantias de que tudo de concreto e funcional estará sempre em uma ordem, numa sequência que planejamos para realizarmos, observarmos e compreendermos o mundo, através da nossa existência num espaço que exige ação e reação.

No entanto tenho notado algo estranho em relação ao tempo, parecendo-me que hoje em dia até as nossas ideias e pensamentos aceleram a forma de vida que levamos.

E consequentemente acelera-se o tempo que poderíamos e “teríamos” por direito, para sonhar, imaginar, criar e refletir sobre as coisas mais simples e importantes.  

Mas faltando-me a sabedoria que somente o tempo tem o privilégio de doar, meu estranhamento baseia-se muita mais em indagações do que certezas...

Atualmente minha relação com o tempo tem se estruturado, por exemplo, na tentativa de compreender o envelhecimento, numa sociedade que prega a juventude eterna; no uso que faço do tempo, precisando (e me cobrando) cumprir satisfatoriamente todas as inúmeras funções que ao longo das minhas necessidades (realmente necessárias ou não) me incumbi de realizar; no meu amadurecimento como mulher dentro de relacionamentos amorosos, familiares, amigáveis, sociais; no meu posicionamento dentro de um sistema planetário e social, à medida que vou tomando consciência, e logo, tornando-me responsável por agir ou não em conformidade com minha intuição, valores e princípios, e tantos outros aspectos na vida de alguém. Aspectos que parecem ser apontados somente quando notamos que estamos, em verdade, dentro de um vagão aberto de um trem, em movimento, e que não só as paisagens se modificam, mas o ar, a chuva, o vento, o frio e o sol dessas paisagens acabam por também nos causar mudanças externas e internas.

Viver um dia após o outro não poderia ser uma expressão tida como metafórica ou meramente popular. Apesar da sabedoria dada à fala do povo, seria como limitar tamanha verdade. Se estamos vivos, estamos em movimento, e o mínimo que pode ser feito da nossa parte, é viver, e viver de acordo com esse movimento. A essência é o movimento, e é sua manifestação em contato com as particularidades da vida e das pessoas que é oscilante.

Quem aqui já ficou bem doente? Ou pôde presenciar ou ouvir uma história sobre pessoas com doenças bem graves, que viveram por muito tempo em estado vegetativo, mórbido ou mesmo apenas não podendo mexer-se tanto?

Há vida ali, naquele corpo? Porque não haveria? O movimento pode ser de natureza interna. Quem pensa, ama, sofre, culpa-se, alegra-se, está vivo, mesmo sem executar movimentos externos. O tempo continua agindo sobre tudo, e as consequências do movimento e de seus ciclos são as mesmas. Não há nada que escape à incidência desse movimento invisível, mais compreensível para nosso entendimento na definição de “tempo”.

Mas se a rotina para alguns é atribulada, cheia de movimento, não se engane ao culpar somente o movimento externo! Você pode estar dentro de um trem acelerado por sua própria vontade, sofrendo muito mais e com maior frequência pelas intempéries da natureza. E nem vai dar-se conta das mudanças — àquelas prejudiciais ou as benéficas.

O tempo, para o homem (e mulheres-maravilha!), é um onda silenciosa que transcorre naturalmente, acima, entre e por meio de nós. Nossos corpos navegam nesse movimento e respondem a ele, com a diferença de que são de essência física, palpável, material. As únicas certezas que sinto neste mundo são sobre a mortalidade do que é material e a de que o tempo está em outra dimensão que não a do corpo físico.

Mas o tempo influi nesse movimento e caracteriza nossos corpos e individualidades de acordo com a forma com que deixamos nos levar ou pelo direcionamento que damos através de nossas atitudes. Estas partem dos pensamentos e das ideias, que podem ou não tornarem-se concretas. Para se tornarem concretas, exigirão movimento da nossa parte. Se não ultrapassarem a fronteira do mental ou imaginário, ainda assim, terão custado algum esforço ou tempo da nossa vida, para terem sido criadas ou desenvolvidas.

Percebe como o tempo molda seu dia?

Agora pense: quanto nós desperdiçamos do tempo - que é a fonte de todo o movimento na vida - em coisas supérfluas, complexas demais, ilusórias, mesquinhas e desmerecedoras de tanto empenho?

O tempo é precioso demais. E sua relação mágica de envolvimento conosco nos coloca numa posição de responsabilidade para com seu uso.

Fazer bom uso do tempo ultimamente, para mim, tem se resumido a dar um tempo a ele.

Não significa abrir mão de tudo, porque sua natureza é inexorável e não há como mudar isso – “o tempo cura...”, “o tempo resolve...”, dizem alguns. Não consigo enxergar cura ou resolução em apatia, submissão e ausência de atitude e reflexão.

Dar tempo ao tempo significa aceitar que seu transcorrer é natural, e que cada um de nós trás um ritmo e velocidade peculiar. As diversas medidas de tempo criadas pelo raciocínio humano servem para nos localizarmos de acordo com o mundo ao redor e com nossos semelhantes, mas são insignificantes no que diz respeito a real compreensão de si próprio e do fluxo maior de tempo que nos envolve.

Nosso reloginho interno é conectado infinitamente a alguma fonte mágica, que nos (des)acelera, pausa, pressiona ou não, ajudando-nos a regular nossas engrenagens para aproveitar plenamente a viagem bacana de trem.


Por: Paloma Portela

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Mulheres ausentes



Tem se comentado com frequência que matamos o feminino em nossa sociedade. Personalidades como Fritjof Capra e Marina Silva são alguns dos que reconheceram essa defasagem histórica em relação à atuação da mulher na vida cotidiana.
Qualidades muito presentes no universo feminino, como o zelar e o cuidar, dos outros e do planeta, há muito estão em baixa na história de nossa sociedade. As mulheres, que se destacam por uma especial habilidade nas relações humanas, em termos de cuidado, atenção, carinho, percepção, compreensão e intuição, tem suas virtudes sendo procuradas como um item em falta nas prateleiras do dia-dia.



Até o mundo empresarial hoje reconhece o papel fundamental que as mulheres exercem em uma organização, principalmente no que se refere à sociabilidade, negociação, comunicação e promoção de um ambiente de trabalho mais humano, saudável, agradável, e por conta disso, também mais produtivo e estimulante.


A ideia aqui não é, de maneira nenhuma, contrapor mulheres e homens, alimentando uma rixa cansativa, dispendiosa e sem sentido, mas notar que, ao longo dos séculos, nossa sociedade tem se pautado por atos e fatos de caráter extremamente racionalista e materialista. Carente da atuação da sensibilidade feminina, a vida assiste o desenvolvimento de um mundo mais frio, competitivo bruto e violento. Isso de maneira nenhuma como uma expressão legítima da masculinidade, mas apenas como manifestação do embrutecimento desta, sem o contraponto feminino exercido em plena capacidade de suas potencialidades. Mulheres estão ausentes.


Se refletirmos apenas por um instante sobre o fato de que a maior parte de todas as pessoas existentes hoje no mundo, em algum momento de suas vidas, dependeram da atuação de uma mulher, reconheceremos que paira sobre nós uma imensa responsabilidade.


De forma bastante lógica, e sem excluir a atuação paterna no que se refere à criação e valores de um indivíduo, a mulher tem um papel decisivo na formação e condução de uma sociedade inteira.


Não que ela deva ou possa ter controle absoluto sobre isso, excluindo as manifestações individuais da personalidade dos filhos. Mas percebe-se como cada gesto, palavra ou ensinamento ausente, se fará sentir mais tarde na vida adulta como um espaço vazio, a ser facilmente preenchido por valores de cunho negativo. Negativo aqui, não em sentido religioso ou moral, mas do ponto de vista do que é mais hábil ou inábil para o desenvolvimento saudável de um organismo ou célula, como a sociedade, os grupos e as famílias o são. O que trabalha para sua construção e manutenção, e não autodestruição e aniquilamento. Uma concepção mais natural, que vigora acima das diferenciações advindas da cultura, credo, legislação ou personalidade individual, e que caminha no sentido de uma comunidade humana de valores universais, possíveis de serem partilhados em benefício da maioria.


Mas não é somente no sentido maternal ou familiar que a feminilidade exerce seu papel. 


Se a mulher que não for capaz ou não quiser gerar filhos for destituída de seu valor feminino, o que lhe resta? Pensemos nisso. A mulher é mulher, antes ou depois de ser mãe, sendo ou não sendo mãe. Seus valores (se descobertos e nutridos), a acompanham de forma influenciadora em relação aos grupos nos quais se insere ou está presente, em qualquer fase da vida, atingindo uma abrangência social. 


Durante muito tempo a mulher foi abafada sob uma camada de opressão que pouco evidenciava ou estimulava suas qualidades essenciais e fundamentais: tecelã de relações e conexões (não somente entre pessoas, mas entre ideias, acontecimentos e sentimentos), e por isso de grande poder de influência, ela é o que se poderia chamar de harmonizadora em um organismo sistêmico.


Enquanto que o homem apresenta ótima desenvoltura em atividades de cunho mais pontual, cujo conceito polar positivo remonta à força, coragem, destreza, resistência, ação e realização, é a mulher quem ajuda a manter, conciliar, balizar, conduzir, nutrir e entremear estes processos, também por conta de seu papel social e sua ancestral relação com esferas como a criação, educação, gestação, alimentação, reflexão, mediação,  beleza (em seu sentido expandido e não mercadológico), organização, zêlo, acolhimento e hospitalidade (no sentido da conservação de um lar).


Sua sensibilidade e atributos conferem a ela um papel sobre o qual não é possível se ausentar sem prejuízo, pois faz parte de sua concepção influenciar e acalentar de forma sistêmica e generalizada toda a teia de uma configuração social.


Livres de uma condição histórica paralisante e submissa no passado, que faremos agora com um legado social, ambiental e cultural que há muito pede uma compensação na forma de uma atuação feminina? Quão ausentes temos sido de nossa própria condição?


Por: Caroline Derschner

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Todos os caminhos levam a Roma

Imbuída de um sentimento coletivo e de origem desconhecida, aos 10 anos decidi que minha Barbie precisava de um marido. Não bastavam os vestidos feitos pela minha mãe, ou comprados na feirinha. Minha Barbie precisava de mais um acessório: o Ken.

O que foi feito de esforço para conseguir aquele boneco não se mede em palavras, mas finalmente ele chegou. Trouxe segurança e companhia a minha boneca, cansada de dormir sozinha na estante, e uma estranha sensação de que os problemas advindos da solidão acabavam na companhia, constante e infinita, de um esposo.

Hoje, já um tantinho mais vivida, começo a desconfiar de que as meninas nascidas de um bom tempo pra cá são mais ou menos “predestinadas” a acreditar no casamento.

Casamento: uma junção de pessoas e valores, e, provavelmente, uma das mais antigas instituições da humanidade.

Confesso que esta “predestinação”, com muitas aspas, tem se parecido muito mais com uma forma encontrada por algumas mulheres - atualmente, tão confusas com seus próprios estados interiores - de não se sentirem sozinhas, de terem seus desejos de atenção e prazer atendidos, ou uma busca desesperada por uma felicidade que ela própria não consegue mais enxergar em sua inata existência singular.

Não há como negar que muitas acreditam realmente sentir amor aos seus cônjuges, e desejarem dividir suas experiências com seus parceiros (as).

Mas com tantos casos de divórcios, separações, traições, crimes passionais, ou mesmo, o famigerado medo do comprometimento e da responsabilidade que aumenta, ao fazer parte desta instituição, duas possibilidades me ocorrem de forma instantânea: ou estamos bem confusos com o que chamamos de amor, ou estamos desesperadamente assustados com o fantasma da solidão!

Eu, Paloma, ainda acredito no casamento. Ainda acho que existam homens e mulheres que, longe dos mesquinhos desejos materiais e físicos, sintam algo que vai ainda além da entrega a outrem. Pessoas que creem que, sozinhas, são inteiras, completas, mas que sabem que o amor, finalidade única de uma união afetiva, exista também no encontro com outra pessoa, com suas características próprias, e que ambas somarão a felicidade das duas. São estradas paralelas, com automóveis que andam para a mesma chegada.

Não que o matrimônio seja a salvação, mas o amor, em sua verdadeira plenitude – se é que ainda merecemos senti-lo – não só serve de base, como orienta para as ações, aquelas que trazem uma sensação sincera e quase palpável de harmonia com o mundo, por mais perdido que ele pareça!

Aí no meio do texto você pensa com sarcasmo: “- Muito romantismo...”.

Aí eu te escrevo que o amor a que me refiro aqui, passa há anos-luz de distância deste conceito meloso e fraco que muitos acreditam sê-lo. E digo o mesmo do casamento!

O amor é forte, e não sempre simpático e agradável aos olhos dos outros. O amor sincero de um pai, por exemplo, está em advertir seu filho sobre os perigos, sobre as atitudes que carregam em si mais possibilidades de erros e sofrimento, e definir limites necessários para seu bem, enquanto não atingir maturidade e discernimento para agir sozinho. Mas também está em estimulá-lo a ser capaz de se perceber como sujeito atuante, a tomar iniciativas e desenvolver habilidades.

Um verdadeiro amigo, que tem verdadeiro amor, não estará sempre ao seu lado, caso você opte por uma vida inconstante, negativa, e que te acarrete dor. Ele pode até estar lá, possivelmente, alertando sobre seu estado, buscando seu bem estar, mas nunca participando dos atos.

Um homem que ama verdadeiramente uma mulher, numa relação amorosa, não a prejudica, não lhe causa dor, a não ser, nesses fios doidos e intrincados que ligam a gente por aí... Mas ainda assim, quando há algum obstáculo, algum nó, e ambos sentem algo forte e sincero, pode ser que isso sirva para que amadureçam e tornem-se ou uma mulher ou um homem melhor. E isso independe de continuarem sendo parceiros ou não.

Todas as possibilidades têm como melhor ponto de fuga o amor, quando verdadeiro. Um sentimento incomparável e o único capaz de guiar um casal de forma harmônica e saudável por esta vida, e que transpassa, mesmo as relações mais trabalhosas. Porque casar e conviver dia após dia com uma mesma pessoa e todas as suas mudanças no decorrer do tempo, exige, definitivamente, muitíssimo esforço! Que não seria exigido das partes envolvidas se não houvesse um sentimento verdadeiro que os impulsionasse.

O que se tem chamado de amor, a meu ver, são uma série de sentimentos confusos de medo e carência. E não há nada mais cruel do que esse tipo de covardia, mascarada pela necessidade física, falsamente afetuosa e exagerada. Ela é cega, vil, frágil, e mesmo assim capaz de causar muito estrago. E o pior, não mostra a verdadeira personalidade daquele que se esconde sob ela. Isso, realmente, não me parece amor.

Se o amor fraternal, paternal, maternal, amigável, amoroso, tem a intenção de sempre levar os envolvidos a um bem estar, mesmo que não imediatista, porque não acreditar que, sim, vale a pena entregar-se de corpo, alma e vida a outro que faz o mesmo, conscientemente a você?

É claro que às vezes é um pouco complicado perceber o grau de envolvimento de outra pessoa dentro de nossas vidas, mas para isso, homens e mulheres são munidos, de nascença, daquela voz sutil que bate, teima, sugere, alerta de fininho ou berra nos nossos ouvidos: a intuição!

O amor é um objetivo, um farol que orienta. Como uma casa estilo mansão imperial, confortável, mas que exige limpeza, cuidados e manutenção. O amor assegura ao homem a certeza de que a sua existência já é algo muito lindo e importante, para ele próprio, seguir em frente. E para essa outra pessoa que o completa, isso também será um sentimento impulsionador, de alegria, de motivação para suportar as dificuldades, resolver os pepinos e abacaxis de uma relação, e saborear, com todos os sentidos, uma união leal, fiel, sadia e respeitosa.

Assim, como em tempos remotos quase todos os caminhos levavam a um único império, hoje, os nossos caminhos também nos levam a algum lugar. Mas as estradas estão bem mais entulhadas e com um horizonte turvo. Por pedregulhos, restos de brigas, guerras, rancores, estilhaços de terceiros, armadilhas e tudo o mais que podemos, ou não, imaginar. Mas saiba que, solteira (o) ou casada (o), o amor sempre conduz as coisas para os melhores destinos, para os grandes impérios. Indestrutíveis...

Por: Paloma Portela

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Consciência corporal – O retorno

Nosso corpo sabe.  A inteligência que perpassa nosso ser como um todo, deixa no corpo um de seus reflexos mais perceptíveis para nós.

Depois de uma fase de correria, atribulação, desgaste ou um trauma emocional, nosso corpo guarda e marca em sua dinâmica algo do estresse passado. Eu já tinha lido sobre isso em vários lugares, mas não havia percebido o impacto que isso pode ter, até acontecer comigo.

Só algum tempo depois de uma fase difícil e muito estressante, pude ver como cada vértebra e músculo estavam ressentidos: tensos, enrijecidos e mal humorados. Quando vi que nada se mexia ou funcionava como deveria, percebi que meu corpo havia acumulado tanto quanto minha cabecinha e o coração durante aquele período difícil.  

Foi quando, em dado momento, fazer um simples alongamento no pulso me trouxe à tona a uma consciência corporal já esquecida e negligenciada durante o período de estresse - algo havia acontecido aqui dentro.

Um corpo exaurido, uma mente esgotada e uma alma entristecida. Difícil caminhar nesse estado não é mesmo? Difícil promover as mudanças sempre necessárias na carreira, relacionamentos, vida pessoal e intelectual desse modo, não?

Então lá fui eu dar toda a atenção que meu ser, começando pelo corpo, necessitava: ajuste nas horas e períodos de sono, exercício, alimentação correta, contato com a natureza, menos computador, definitivamente, menos computador! Desintoxicação emocional, revisões internas ainda sem data para acabar, e um sentimento de acolhimento, que aprendi com uma amiga muito querida, que é algo como “a capacidade de se abraçar”, no sentido figurado. Cuidar de si, conversar consigo, dar atenção a nós mesmas, procurar entender quais são os entraves, as necessidades prioritárias, os curativos a serem feitos.

O resultado de uma pequena, quase mínima parte, digerida desse grande e múltiplo processo, eu conto aqui para vocês...

Naquele determinado período complicadinho, mal sabia eu que de nada adianta dormir e descansar, se você dorme mal, tem insônia de noite e muito sono no meio da tarde, períodos em que, biologicamente deveríamos ter sono e disposição, respectivamente. Tudo bem, todos temos nossos ritmos, mas nosso corpo, com seus fluxos, transformações, processos celulares, enzimáticos e outros, não está apartado do meio que o circunda, o que inclui o dia, a noite, determinados horários, estações do ano, temperaturas e etc.

Se não é nenhuma novidade que lua e o sol influenciam nossos processos corporais, como não atentar para isso? Se até para os praticantes do Tai- Chi, por exemplo, é sabido que se deve acordar cedo para receber a energia matinal que desponta cedinho a cada manhã, e que regerá os processos da natureza ao longo de todo dia, como nós podemos querer tentar participar disso somente de acordo com nossa agenda? Não é nada místico, veja bem, eletromagnetismo, fotossíntese, absorção de nutrientes pelas plantas, pelos nossos ossos, tudo caminha em perfeita harmonia no frescor de um dia bem começado e bem aproveitado. Mas isso havia passado despercebido para mim, e dormir mal ou com um sono desequilibrado foi o primeiro ponto negativo para meu corpo, sentido somente algum tempo depois.

A alimentação foi outra que somou mais alguns pontinhos. Não é a toa que parece que os médicos dão sempre os mesmos conselhos, mas... Sabemos por que eles dão estes conselhos?

Uma dieta pobre em vitaminas e rica em alimentos com efeito bioquímico semelhante aos antidepressivos, relaxantes e estimulantes - como café, carboidratos, açúcar, chocolate e gorduras, podem destruir o organismo e a disposição de qualquer um a longo prazo. Acredite. Não estou falando só de questões como aumento de peso ou estado da pele, desencadeados pelas mudanças hormonais e padrões de alimentação, estou falando também de coisas como alegria e disposição.

Todo mundo diz que é importante comer frutas, verduras, vegetais e cereais, mas poucos sabem que a variedade de vitaminas e componentes que uma refeição balanceada nos dá é fundamental para o bom andamento de nossa vida emocional também. O equilíbrio de nutrientes variados em nosso corpo pode influenciar processos e doenças, que vão desde um cansaço, irritação ou dor de cabeça, até problemas mais graves, como câncer e depressão. Sim, comer aquela fruta no café da manhã, saladas, legumes e vegetais é muito importante para sua vida. Mesmo!

Dormir, comer e... Agora eu vou entrar em um território um pouco mais delicado, porém, fundamental de ser explorado na época em que vivemos, que é o dos pensamentos, sentimentos e intuições.

Longe de estarem apartados de nossos processos físico-emocionais, eles fazem uma ponte entre nossas materialidades mais densas: corpo, tecidos, células; e as mais sutis, como átomos, eletricidade e vibrações energéticas. Calma, sem susto, eu já explico!

Veja só, por exemplo: um único pensamento (materialidade sutil) é capaz de desencadear uma onda elétrica, que por sua vez, estimula um processo bioquímico, que irá atuar diretamente no corpo e em nossos órgãos (materialidades mais densas), trazendo saúde, longevidade e nutrição a determinadas partes dele, ou intoxicando, degenerando, causando mal estar e doença. Um dos exemplos mais comuns e fáceis de visualizar é a gastrite nervosa. Para quem tem, já teve ou conhece alguém que tem, sabe do estou falando, e de como sentir, pensar e intuir, tem tudo a ver com acordar de bom humor e disposto (e até se viver uma vida inteira assim), ou pelo contrário, passar boa parte de seus dias de mau humor, desanimado e com dores que mudam de lugar a cada dia.

Ampliando o quadro não é difícil ver como tudo participa de uma dinâmica maior, capaz de desencadear efeitos concretos e muito sérios, já que as emanações sutis que nos circundam, atingem também nosso físico, não interessa se as vemos ou não. Nossos estados internos podem ser influenciados de forma positiva ou negativa por tudo que está a nossa volta: pessoas, lugares, ambientes, sons. Não é preciso ser hipersensível para ser influenciado por algum barulho ou música que ouvimos com frequência ao nosso redor, por exemplo. Não vemos o som, não vemos a raiva ou a tristeza, mas eles estão lá, existindo e atuando sobre todo o nosso ser e influenciando nosso corpo, nossas decisões, nossas vontades. Feliz daquele ou daquela que conseguir sair um pouquinho da correria da vida cotidiana para perceber o que atua sobre nós durante o dia-dia, e de que forma. Mais feliz daquele que souber filtrar as influências que nos circundam de forma proveitosa para si.

Parece chavão, mas a saúde é mesmo um conjunto intrincado de relações que vão muito além do que acontece entre os problemas que nos são perceptíveis, e os remédios prescritos por um médico para tratar de tais problemas.

E as mulheres, que quase sempre são mais sensíveis que os homens, tendem a ser muito mais suscetíveis aos desequilíbrios de um modo geral, não importando se malham ou se têm resistência física. Temos que cuidar de nós mesmas e reaprender como se faz isso com urgência, pois é urgente.

Nunca antes na história estivemos expostas a tantos fatores nocivos, que tendem a nos causar dano quase que ininterruptamente. E o pior, nunca antes, também, fomos tão responsáveis por estes fatores e estados como agora, co-participando e nutrindo coisas que no final das contas, acabam não nos fazendo bem. E como eu disse, um indicador bem perceptível disso é nada mais nada menos do que o próprio corpinho que nos carrega.

Lá atrás, quando pude sentir a impressão de um corpo dolorido, uma mente improdutiva e uma emoção maltratada sobre minha consciência, não restou outra coisa senão ir correndo cuidar de mim. A boa notícia é que sobrevivi, melhorei, e esse período todo, ao menos, me rendeu um bom assunto (longe de terminar), para trazer aqui para vocês, no Beabá!

Um grande abraço!

Por: Caroline Derschner

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Alicerce

As arquitetas e os arquitetos talvez me compreendam mais rapidamente em relação aos outros, mas em quase toda vida humana se empreende uma obra (péssimo trocadilho...).

Em algum momento da nossa existência iniciamos construções, reformas, às vezes até muros de pedra sobre barranco puro, virgem e rígido.

Derrubamos árvores antigas com o pesar de quem, intuitivamente, sente que inicia pelo passo errado.

Arrancamos asfaltos esburacados, quebramos pisos, deslocamos móveis... Criamos entulhos sem local definido para nos desfazermos destes.

Muito escrevo nos meus textos sobre mudanças. Quase sempre internas, raízes das externas. E estas, por sua vez, nos moldam perante a vida. Quando a sabedoria chega, nos torna inteiros, sem fronteiras entre o que somos, o queremos ser e em como o outro nos, verdadeiramente, enxerga.

Interesso-me pelo tema porque não conheço homem ou mulher (maravilha) que tenha alcançado a almejada sabedoria, maturidade e paz de espírito que tanto sinto necessidade. Mas neste ano, perdida entre confusões e balanços, concluo que estive com pessoas (homens e mulheres-maravilha) que buscaram, pelo menos, empreender tais obras e, claro, externaram seus sonhos, suas alegrias e dificuldades, dividindo comigo experiências e encontrando caminhos.

Tive este privilégio! E esse foi um dos meus trunfos neste ano que finaliza. Apenas um destes anos, entre os outros de minha vida, em que pude viver justamente pela e para a felicidade de não temer mudanças, tendo como apoio o cuidado por si, e a atenção amorosa daqueles que, em algum momento, me inspiraram a derrubar paredes ou trocar portas.

Não vivi vidas alheias, não sonhei a vida destes para a minha. Agi de forma diferente com os instrumentos usados nessas empreitadas, que resultaram em conclusões novas para o que, até aqui, tenho capacidade de enxergar, pisando com segurança sobre cada pedaço de chão que me suporta e que me serve de parâmetro para que nunca me esqueça das origens e limites que tenho.

Fiz isso como mulher, tentando, muito insatisfatoriamente, descrever pensamentos nesses textos, cheios de incoerência e muitos erros gramaticais e ortográficos (obrigada, Carolzita, pelas revisões!); escolhendo cada vez melhor minhas companhias; afinando uma beleza mais gentil e cuidadosa, menos frívola; alimentando uma chama interna que aquece e queima mesmo nos dias mais solitários; uma tranquilidade, que não é transcendental, mas, realista e comum. 

E nada ainda pareceu, nem de perto, ser o suficiente. A cada novo ano, dia, um novo defeito grotesco descoberto! Uma mania irritante, uma impaciência nos períodos de TPM, choros guardados, dores que não se fecham, temores e sentimentos intuitivos de alerta que causam ainda mais temores... Porque nem só de flores pode se levar a vida... Até poderia, mas não estou – ainda – apta para isso.

No entanto, não somente de obras e desconstruções se vive. Mas elas são cada vez mais urgentes, pelo que observo sobre o mundo e todos nós, ano após ano.

Será que já vivemos (e levamos para dentro de cada um de nós) tanto vácuo como agora, em relação a outros tempos? Tenho a impressão de que, cada vez mais, carregamos espaços vazios, segundos efêmeros, desperdiçados com as mesmas idiotices de sempre...

Espero que o novo ano, já tão breve, como todos os dias atuais – brevíssimos – traga muitas obras para todos. Repensar atitudes, realizadas ou não, horas jogadas ao léu, pessoas que foram descartadas pelos sentimentos mesquinhos de corações áridos e solitários, mais apego ao humano e desapego ao mundano, lealdade espontânea ao invés de fidelidade cega, mais perdão, inteligência emocional e menos submissão e fúria.

A humildade e a coragem em suas lutas são como capacetes em campos de obra.

Boas reformas!  

Por: Paloma Portela

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Guerra dos sexos - A construção do poder feminino

Já vai longe o tempo em que os maridos mandavam em suas mulheres. É certo que em alguns lugares do mundo, isso não ocorreu como hoje vemos em grande parte das cidades globalizadas.  Mas reconhecemos que a mulher conquistou um lugar social que lhe faz livre para votar, sair na rua, expressar suas opiniões, estudar, escolher se quer casar ou com quem quer casar, e se terá filhos ou não. Direitos que soam até absurdos de não serem concedidos para uma geração como a minha, dos anos 80.

No entanto, da luta legitimada por direitos sociais até o termo “guerra dos sexos”, foram alguns anos de história e também de dominação, e o tal termo de tanto soar por ai, já virou clichê. Em todo caso, o que me chama a atenção, é que o termo “guerra dos sexos” continue até os dias de hoje sem ter seu sentido atualizado, pensado ou refletido. O que quer dizer “guerra dos sexos” hoje? Se existe um termo que sugere uma batalha de um sexo contra outro, porque isso ocorre e em que âmbito isso é considerado? Já parou para pensar?

O termo sugere que haja uma luta, uma oposição, a briga por algo, algum lugar ou uma posição, mas que lugar é esse? Será que a tal da guerra dos sexos pode ser considerada uma luta por igualdade de direitos nas sociedades globais? Ou por um lugar bem específico e que conhecemos bem: a posição de dominação e controle, de supremacia, historicamente cunhada pela classe masculina?

A insatisfação e a revolta com essa condição de superioridade histórica, (repito, histórica, portanto factual), fomentou muitas revoluções e cunhou no imaginário contemporâneo o termo guerra dos sexos, que sugere que sim, há uma batalha pela conquista de algo. Mas quando falamos em guerra dos sexos hoje, pelo que se está lutando?

Entre lutar por igualdade de direitos e lutar pelo posto de dominação que a sociedade patriarcal exerceu de forma contingente e não inerente (repito, contingente e não inerente) durante tanto tempo, muita coisa se confunde e se mistura.

Se olharmos com cuidado, podemos reconhecer nesse processo histórico, sintetizado hoje pelo termo “guerra dos sexos”, uma busca pela força, pelo poder e pela capacidade de dominação, durante tanto tempo exercida sobre nós mulheres. Sentimentos que muitas parecem carregar à flor da pele, nutridos por uma ferida aberta há muito tempo, cuja dor atravessa as gerações.

O que passa despercebido, no entanto, é que na fermentação e no desdobramento das revoluções sociais em diferentes épocas e países que emancipou as mulheres enquanto cidadãs, moldou-se quase que ao mesmo tempo, as sutilidades de um novo e paradoxal modelo de dominação e controle, forjado no ódio, na raiva e no ressentimento.

Silenciosamente e quase que imperceptivelmente, da ideia de uma“mulher vencedora”, alguns estereótipos se formaram, transformando esta na mulher dominadora do sexo masculino, que culturalmente tem o “homem aos seus pés”. A culpa não me parece ser das revoluções sociais, nem da conquista de direitos de cidadania pelas mulheres. Mas não foi difícil crescer ali, em um território marcado pela opressão e humilhação, o desejo das mulheres de dominação sobre a classe masculina.

A construção da versão estereotipada do poder feminino que seguiu esse triste rastro, se encaminhou para a formação de uma imagem da mulher como um ser capaz de domínio e poder sobre o homem. Não através da força, mas pela sedução.

O estereótipo fatal, que seduz e domina, por outros meios que não os das castas masculinas do século quinze. São mulheres implacáveis. Não sei se todo o estereótipo cultural guarda marcas de um processo histórico, mas a construção do poder feminino contemporâneo esbarra nesse tipinho típico com assustadora frequência. Exageradamente sexualizadas, belas, famosas, vaidosas, indefectíveis, notáveis e capazes de dominar - elas são o novo retrato de domínio social que a tal da batalha dos sexos nos mostra, sem precisar dizer nada.

Podem dizer que não há guerra nenhuma, que isso é apenas um termo, mas é impressionante a estranha simbiose ideológica que há hoje entre valorizar a mulher e fazer valer seus direitos, e cair na falácia cultural da estereotipação feminina que se valoriza, se sobrepõe e ganha espaço principalmente através do corpo, da aparência física e da capacidade de atração do sexo oposto. E onde estão os outros valores femininos, que não sejam os atributos estéticos e materiais? Onde ficam no meio do vale tudo de mulheres indefectíveis e sedutoras, brigando por atenção e controle?

Se as mulheres queriam se libertar de um lugar de dominação, sem querer, acabaram escravas de uma nova condição de si próprias e de um modelo que deixa todas suas outras virtudes e capacidades verdadeiras e perenes, aquelas que não se vão com a idade, a situação social e a aparência física, em segundo plano.

Se tornaram prisioneiras de uma condição implícita que prescreve que uma mulher vale tanto quanto consegue dominar e seduzir a classe masculina, e que entra em parafuso quando não se faz valer por esses atributos.

Hoje, esse consenso cultural paradoxal atinge a mulher, rebaixando-a a uma condição vazia, inferior e empobrecida, sem que no entanto, ela se perceba disso com clareza.

E nessa bagunça histórica, emocional, cultural e midiática, eu me pergunto: será que já não é hora de novas revoluções? Nos emanciparmos da própria imagem construída para a valorização feminina hoje, parece, aos meus olhos pelo menos, uma guerra muito mais urgente do que a tal da guerra dos sexos.

Por: Caroline Derschner

sábado, 15 de outubro de 2011

Quanto vale?


(Escrito um dia antes de uma nova estrela surgir no céu.)

Numa época em que grande parte da humanidade parece ter aderido ao capitalismo, observo que quase todos os elementos das nossas vidas, seja no cotidiano mais árido, ou nas questões mais existênciais do ser humano, são medidos por um padrão de qualidade cada vez mais concreto, material, fútil e volátil.

Ter, viajar e mostrar se tornaram verbos chave em quase todas as conversas que tenho ouvido – ou lido, já que estamos em plena era digital – entre minhas amigas.

Mas pouco vejo de verdadeiro entusiasmo ou conhecimento adquirido nas experiências relatadas, que poderiam ter sido muito mais aproveitadas, se vividas de forma mais profunda ou simplesmente simples.

Essas minhoquinhas e mais alguns acontecimentos recentes me fizeram hoje, questionar-me aqui com meus pensamentos, a seguinte reflexão:

Quanto vale uma vida? Como saber se o que eu levo é uma boa vida ou, talvez, mediana, difícil...? Como equacionar isso?

Usando-me como cobaia para essa divagação, vamos ver se consigo construir e resolver essa continha...

Lembro que na minha adolescência eu queria sempre ter; ter aquela bolsa incrível, aquele esmalte maravilhoso, aquela calça... Ah... Aquela calça super difícil de encontrar! E mentiria se dissesse que meu humor não mudava após a aquisição daqueles mimos. Mas a euforia só durava até colocar os olhos, ou escutar, a publicidade do próximo grande objeto de desejo do momento...

Aí tomamos gosto pelas viagens! Viajar quase sempre é uma delícia, pelo menos para mim. Sair da rotina, mudar os hábitos, conhecer lugares e pessoas diferentes... Mas viagens podem ser muito mais do que fotos tiradas e visitas a lugares novos. Viajar também significa aceitar os costumes e conceitos de um local novo, diferente do seu de origem; significa viver como um cidadão diferente do que você costumava ser no seu lugar de origem.  Viajar é passar por estradas, rodovias, sobrevoar cidades, estados e países, com histórias únicas. É voltar ou se sentir além do tempo usual. É olhar nos olhos das pessoas deste novo lugar e sentir que mesmo com idiomas, política, estrutura social e cultural diversa, a essência humana é quase sempre a mesma.

E aí eu me pergunto... Com isso em mente e, por exemplo, com pouca grana no banco ou dificuldades de locomoção, não seria possível aproveitar de forma similar uma boa leitura de um livro sobre a Índia ou Afeganistão? Ou assistir a um bom documentário sobre a cultura brasileira nordestina, sobre as tribos indígenas amazônicas ainda isoladas da civilização moderna? Viajar, desta forma, ganharia uma visão muito mais ampla e relativa.

E quanto à época das celebridades, mostrar as minhas conquistas, eu sempre faria para as pessoas que eu amo, e que sei da sincera admiração e carinho para com meus ganhos, e que sem dúvida também estariam a postos para me auxiliar nas minhas dores e perdas.

Vamos equacionar?

(...)

Pois é... Essa vida me custa tão pouco... Eu só preciso cuidar da saúde do meu corpo - e nesse ponto dou um grande viva à medicina atual - amar, aceitar, aproveitar, fazer e observar, e reclamar menos...

Conheci há pouco tempo uma garotinha linda, cheia de vida e limitações para vivê-la. E ela sempre, em quase todas as nossas conversas, era só sorrisos e gentilezas. Atualmente está travando, talvez, a mais dura e decisiva luta de sua vida, e lembrando-me dela nestes dias com mais força, me questiono esses valores que damos a tudo nas nossas vidas. Posses, aparências, soberba, orgulho...

No fim, paradoxalmente, a medida destes valores de vida acaba encontrando sentido na iminência da morte. Independente da sua forma de interpretação, querido(a) leitor(a), minha consciência profunda da morte é que me serve, hoje, de parâmetro para viver. Para medir a humildade com que lido com o outro e comigo mesma, com os meus medos, as minhas raivas, frustrações, dores, vaidades, ninharias... É nessa passagem para algo desconhecido que vejo a igualdade dos seres. E por isso mesmo, procuro me prender às coisas que ainda posso modificar ou melhorar, aqui, em vida. Não para validar uma eternidade feliz, mas, acima de tudo, para fazer valer – e agradecer - a vida que tenho.  

Espero ter a liberdade de me livrar de tudo que me pese e que me impeça de lembrar que o que eu vivi e a forma como vivi, foi a mais bonita e dedicada. Com todas as limitações que nos são impostas, seja pela falta de dinheiro numa sociedade capitalista, ou uma doença grave, ou por qualquer outro motivo, se o preço da minha vida valeu, muito mais pelos sorrisos dados e ganhos, ela me valeu bem, e me custou bem mais em conta do que tudo que apostei nela.

Por: Paloma Portela