terça-feira, 7 de junho de 2011

Licença, maternidade.

Ler qualquer revista de gente famosa e não se deparar com uma porção de mamães felizes exibindo seus barrigões, ou uma prole numerosa e sorridente, dessas de propaganda de pasta de dente na TV, hoje em dia é muito difícil. Muita felicidade parece exalar de todas as relações familiares coroadas com a presença de um pequeno ou uma pequena. Seja quem for, onde estiver e com estiver, a chegada de um filho parece dar sentido à existência de muita gente, já que é uma nova e agradável fase da vida, e para muitos, parte fundamental do projeto dela.

Ter um bebezinho deve ser uma experiência maravilhosa, e até eu, do alto de meus 23 anos, me pego desavisada suspirando diante das fotos que parecem atestar que o nascimento de um filho é o derradeiro brinde de felicidade na lista de sonhos e realizações de uma mulher, de um casal, e às vezes de uma família inteira. Mas, de volta ao mundo real, pressinto, quase que imperceptivelmente, algo de estranho no ar.

Em meio ao desejo partilhado por tantas, do filho que um dia virá, parece haver, em alguns lugares, pequena e tão escondida que quase não se vê, uma leve pressão, um afã, uma pressa.

Pressa, afinal, se a maternidade é tão boa assim, parece que em certos momentos, não vivenciá-la é sinônimo de frustração e negação da tão sonhada felicidade, para qual, fomos educadas enquanto mulheres. Mulheres que vivem em uma sociedade arraigada na plenitude da satisfação de desejos criados por nossa cultura. Sejam eles quais forem. Mas será que é bem assim?

Já faz algum tempo que a mulher não é mais educada para ser só mãe, mas mesmo assim, séculos de fermentação de um desejo imprescindível de ser mãe, fazendo desse seu papel social principal e seu direcionamento pessoal, perduram. E esse desejo, levado ao extremo, “espetaculariza” o momento tão bonito, íntimo, familiar e delicado que é a maternidade. Não escolhi esses adjetivos à toa, pois todos eles evocam uma ideia muito especial de proteção e resguardo. A gestação e o cuidado com um bebezinho estão desde a fecundação, voltadas para dentro. Dentro da barriga da mãe, dentro das emoções que envolvem a criança muita antes dela nascer e dentro do carinho e amor que há entre um casal - lugar que poucos, além do próprio casal, poderiam ser convidados a comparecer e conhecer.

Eu não pretendia citar o padre Marcelo Rossi, para não fazer associações religiosas, mas acho interessante fazê-lo, pois bem recentemente ele esteve mídia afora, alertando mulheres grávidas para que se guardassem dos olhares invejosos vindos de todo o resto de uma população feminina, em parte, insatisfeita e triste. Insatisfeita e triste por quê? Em tempos como os atuais, sem perceber, absorvemos ideias, pensamentos, fatos alheios, que mal sabemos nós, se servem ou não para nossa realidade e nosso momento de vida. Essa “espetacularização” da maternidade não está só na mídia, mas na sociedade em geral, perguntando insistentemente às pessoas quando irão encomendar o bebê, ou se já estão planejando o próximo. Parece haver uma avidez nisso tudo, uma pressa, um anseio de realização, quase que desesperado, que busca nos filhos, nos netos e nos sobrinhos, o encontro da felicidade feminina. E não é bem por ai, sabemos que não é. Para muitas esse dia não virá, ou ainda levará algum tempo. Um tempo que, mesmo sem filhos, é feliz e benfazejo, pois constrói, aos pouquinhos, a maturidade necessária para vida, e para a maternidade também.

Eu também quero ter um filho um dia. Também sei que existe uma expressão, que faz tremer tantas mulheres, chamada reloginho biológico. Vira e mexe me deparo com ela, e é quase que impossível não vir à mente a imagem de um relógio, não um reloginho, como diz o termo, mas um enorme relógio do século dezessete, daqueles bem pesados, no qual cada volta do ponteiro parece avisar de uma pressa. Um tempo que corre passa vazio sem a chegada de um filho. E isso não é verdade.

Ser mãe antes de ter encontrado a si mesma, infelizmente não é uma realidade só das comunidades carentes ao redor do mundo. Das aldeias, vilarejos e favelas onde a gravidez precoce é regra e não exceção. Essa realidade está também nas maternidades dos bons hospitais e entre mulheres adultas. Porque maturidade, não vem só com a idade, ela vem de dentro, de um desejo íntimo de reconhecimento de si e evolução, de firmar o passo na caminhada da vida. E quando nos chega a feliz novidade da chegada de um pequeno em nessa caminhada, essa mulher terá muito que doar de si, para o cuidado e crescimento de seu filho. Mas ela só investirá nele, tanto quanto puder ter investido em si mesma antes desse dia chegar. E as tão aguardadas horas de felicidade junto ao bebê, com o tempo e principalmente lá pela pré-adolescência, farão muita falta em meio ao despreparo.

Mulheres, meninas, mães maravilha. A dica Slow, parece caber aqui também para nós. Vamos com calma. A finalidade de nossa existência não está só na maternidade, como a ciência e a biologia parecem fazer crer. E o encontro de nossa felicidade não está no filho que está por vir. Estar bem e feliz consigo mesma, ainda vem antes das lembrancinhas na maternidade e será muito necessário nas reuniões do colégio daqui a alguns anos. Será mais necessário ainda durante as conversas francas, e nas respostas das perguntas sem fim que todos os filhos fazem às suas mães. Por essas e outras, Slow! Vamos pegar mais leve nessa vontade, e sempre que possível, deixar as revistas de cabelereiro de lado. Panfletagem de gravidez e frustração com a própria vida é uma mistura que não combina, e que pode gestar, durante muito mais do que nove meses, inveja e negatividade. Isso sim dá motivo para a choradeira interna de ambas as partes, e é capaz de tirar o sono de muita gente no meio da madrugada.

Por: Caroline Derschner

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